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sexta-feira, 8 de novembro de 2019

Um clube de ciências e a decisão de ser cientista.



Apresento a seguir a entrevista, na íntegra, com a profa. Leticia de Oliveira da Universidade Federal Fluminense (UFF) na qual ela relata o papel definitivo que um clube de ciências teve na vida dela. Para saber mais sobre a profa. Leticia, acesse o link do CV dela na plataforma Lattes: http://lattes.cnpq.br/5707289165104926. 

1) Profa. Letícia, qual é o nome da escola na qual a senhora estudou e que havia o clube de ciências? Qual é a cidade e quais foram os anos em que participou? Essa escola e esse clube ainda existem? Se sim, a senhora mantém contato com eles?
Com treze anos, na 8ª série, comecei a frequentar a escola, que se chamava Escola Estadual de Primeiro e Segundo grau Arlindo de Andrade Gomes, em Campo Grande, no Mato Grosso do Sul. Eu adorava a escola e era bastante participativa em todas as atividades. No primeiro ano do segundo grau (hoje ensino médio), um professor novo de química entrou na escola, o professor Ivo Leite Filho, jovem recém-formado na Universidade. Lembro que em sua primeira aula para minha turma, eu sugeri que trabalhássemos para a construção de um laboratório na escola. Ele, a princípio, não deu muita importância e eu lembro de ter pensado que ele não tinha o perfil para este tipo de empreitada. Eu não poderia estar mais errada. Em 1988, com a participação de alunos da minha turma, e de outras, sob a condução do prof. Ivo, fundou-se o Clube de Ciências e Cultura Paiaguás.

Figura 1 – Letícia (à esq.) na III  Feira Internacional de Ciência e Tecnologia Juvenil – Blumenau/SC  (22 a 26 de novembro de 1988).

A escola ainda existe e possui um laboratório que foi construído na época do clube de ciências. Conseguimos esta realização! Fiz uma visita recente à escola e foi muito emocionante lembrar de todos os momentos que vivemos na fundação e consolidação do clube de ciências.  O professor Ivo saiu da escola anos depois para ampliar sua atuação em clubes de ciência e feiras de ciência no Brasil. Ele coordena desde 2011 a FETECMS-Feira de Tecnologias, Engenharias e Ciências de Mato Grosso do Sul, FETECCMS Junior e EXPOCIÊNCIA CENTRO-OESTE. É professor da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul e atualmente é Coordenador-Geral de Popularização da Ciência no Ministério de Ciência, Tecnologia, inovações e comunicações. Continua coordenando um clube de ciências vinculado à Universidade. Destaco que eu e Ivo mantemos contato até os dias atuais. Acompanho com muito orgulho o desenvolvimento do trabalho dele, dando espaço a tantas crianças e adolescentes em feiras de ciências nacionais e internacionais. Um trabalho incrível. Até hoje, a primeira mensagem de parabéns no dia de meu aniversário que chega em meu celular, vem dele. São trinta anos de amizade e admiração mútuas.


Figura 2 – Letícia com o prof. Ivo Leite Filho por ocasião da sua defesa para professora titular da Universidade Federal Fluminense (UFF) (julho de 2018).

2) Gostaria do seu depoimento avaliando a importância dos clubes de ciências nas escolas e como isso influenciou na sua vida até mesmo na escolha da carreira acadêmica que a senhora seguiu.

O Clube de Ciências foi um divisor de águas na escola e na vida de seus integrantes. Fizemos expedições científicas ao Pantanal, trabalhamos em conjunto com os professores da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, participamos de feiras científicas em todo Brasil e na América do Sul. Destaco a nossa presença na 41ª Reunião Anual da SBPC, que ocorreu em Fortaleza, no ano de 1989. O prof. Ivo levou um ônibus de estudantes, com idades compreendidas entre dez e dezesseis anos para o evento. Foi algo absolutamente inovador, a organização da SBPC encontrou dificuldade, inclusive, para alojar estudantes tão novos. Este acontecimento foi impulsionador para a criação da SBPC jovem alguns anos depois. Durante a reunião científica, fiz uma apresentação oral sobre um dos nossos trabalhos no Clube. Estava na plateia o professor Crodowaldo Pavan, presidente do CNPq na ocasião. Ao final, ele olhou bem para mim e disse: “você tem um grande futuro na ciência”. O episódio teve um impacto significativo sobre mim e consolidou a minha decisão de ser CIENTISTA.  Depois disto, todas as minhas escolhas, inclusive a de qual faculdade cursar, foram norteadas por esta decisão. Fiz Farmácia na UFMS, mestrado em neurociências na USP e doutorado na mesma área na UFRJ. Ingressei na UFF como professora em 2001, em 2010-2011 fiz meu pós-doutoramento na Inglaterra. Hoje sou professora titular e já orientei diversos alunos de iniciação científica, mestrado, doutorado e pós-doutorado.



Figura 3 – Letícia (blusa branca no primeiro plano) na 41 ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira Para o Progresso da Ciência (SBPC) na Universidade Federal do Ceará (UFCE) – (09 a 15 de Julho de 1989).

3) A senhora consegue perceber, em sua prática, o quanto da clubista ainda vive na professora?

O Clube de Ciências despertou em mim uma paixão pelo conhecimento que cresce a cada dia. O espírito crítico, a importância de boas perguntas, a interpretação cuidadosa dos resultados, as limitações da ciência, são alguns dos aprendizados que iniciei no clube de ciências e que continuam até hoje.  Ressalto também, a importância do trabalho cooperativo. Para realizar uma boa ciência é preciso de muita colaboração entre diferentes áreas do conhecimento e entre diferentes partes do mundo. Para ciência não existem fronteiras. A diversidade também leva a uma melhor ciência, pois pessoas com pontos de vista diferentes são capazes de encontrar melhores soluções para diferentes problemas. Hoje estou engajada na causa de aumentar a diversidade na ciência com o aumento da representação de mulheres, negros e minorias. A motivação para este engajamento foi plantada muito cedo, ainda na época do clube de ciências.



Figura 4 – Letícia com o seu grupo de pesquisa no dia da sua defesa para professora titular da Universidade Federal Fluminense (UFF) (julho de 2018).